sexta-feira, 19 de junho de 2009

A noite caiu sobre o rio



Parque das Nações, 24 de Agosto de 2007


A noite caiu sobre o rio,
O céu escuro, ilumina-se com as estrelas que irrompem brilhando,
Corre uma aragem agradável na noite quente de Lisboa…
Pessoas passeiam calmamente,
As esplanadas, cada mesa, cada cadeira,
repletas de pessoas que conversam, que namoram,
há também as que se zangam,
as que sorriem, as que se olham no silêncio profundo da noite…

Tudo acontece sob o olhar atento do rio,
O rio Tejo que banha a nossa Lisboa,
Que a adorna, dando-lhe a beleza singular,
que nós os amantes desta cidade bonita sabem tão bem apreciar…

Algures no meio da cidade estão também outros, que não se divertem,
Não apreciam, nem desfrutam da noite lisboeta,
porque as falências da sua vida não lhes permite,
porque têm angústia nos seus corações,
ausência de paz,
carência de amor,
de afecto,
de palavras…

Pessoas perdidas no meio da sua solidão,
Tão negra como o céu que se esconde por detrás das estrelas…
não são aquelas que escolhem estar sós,
que gostam da solidão e desfrutam dela,
são os que ligam televisões, rádios, coisas que produzam ruído,
porque não têm capacidade para estarem sós,
consigo próprios,
para escutar o silêncio,
para se escutarem no silêncio,
procuram ruído para não se ouvirem,
para não se ouvirem,
porque de cada vez que param para se escutar,
encontram apenas sofrer e dor,
para no silêncio da noite não escutarem a voz que fala no seu coração,
não querendo assim escutar o seu mundo interno,
porque quando olham para dentro encontram apenas o vazio,
o vazio da noite só…

São pessoas que no meio do seu sofrimento não têm alguém que as saiba ouvir,
Que lhes fale com voz doce e terna,
Que lhes dê afecto com palavras,
Alguém com capacidade para escutar,
Para devolver o que escutam de forma securizante,
Com palavras de esperança,
Alguém que as abrace…
Um abraço é talvez dos maiores dons do ser humano,
Pode dar-nos tanto,
Pode acalmar um coração,
Acalentar uma alma,
Aquecer todo o interior de quem o recebe…
O abraço ‘é algo mágico,
Forte, poderoso,
É demasiado penoso necessitar de um abraço e não ter alguém que abrace…
O abraço ‘e por vezes o colo desejado,
tão necessitado…
Lamento que no meio do ruído da cidade se encontrem essas pessoas,
Com ausência de palavras,
Sem abraços nas suas vidas,
Sem alguém que seja a sua “pessoa”,
Sem serem a “pessoa” de alguém,
Pessoas que olham a televisão angustiadas,
que ouvem sem escutar,
que olham o vazio,
anseiam que o telefone toque,
nem que seja um qualquer vendedor da banha da cobra,
mas que no fundo está lá,
tem uma voz audível,
liga e fala,
apesar das suas palavras não serem as que se querem ouvir,
mas fala para esse alguém que já nada ouve,
porque ninguém o escuta, o apazigua…

Ao fundo o rio…a noite…Lisboa…
A música que toca…alguém que canta…o rio…Lisboa…

Amanhã essas pessoas acordam, sem despertar,
Acordam apenas porque o sol nasceu…
Levantam-se, acordam,
De novo ligam algo que produza ruído,
Que quebre o insuportável silêncio das suas vidas,
Ouvem notícias sem nexo, que apenas relembram a loucura do mundo em que vivem,
…a solidão…
a angústia continuam vivas,
a palpitar no seu interior,
…o telefone continua a não tocar…
…é mais um dia…
…mais um dia de nada…
…vazio…
…mais um dia sem um abraço, sem um carinho,
Mais um dia silencioso,
Mais um dia sem expressão de afecto,
…de novo o coração que aperta,
Que dói,
as lágrimas que escorregam pela face,
…a ausência…
…o nó que sufoca o respirar…
…o ar pesado que insiste em não querer passar…
…o pânico…
…o pânico na solidão…o medo…
…a angústia,
…os fantasmas que produzem sons inaudíveis, paralisantes,
…a solidão..
…o abraço que não tem braços para o dar,
…o vazio…o sofrer…

Ao fundo o rio…a noite…Lisboa…

2 comentários:

  1. É assim realmente a "nossa" Lisboa

    Bem-hajas por partilhares os sons que na tua alma se produzem e na tua voz nem sempre se ouvem... Um bj grd

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  2. É lindo este poema. Um texto lindíssimo magistralmente enrpupoado com traje de poema que demonstra, em primeiro lugar a excelência da poetisa, a Cátia é indubitavelmente uma poetisa com muito talento; em segundo lugar um elevadíssimo grau de sensibilidade, e em treceiro, demonstar que é uma pessoa que não anda no mundo só por andar. Vê, abserva, sente, lê e compreende. Fantástico. Estou rebdido ao seu talento e à pessoa que demonstra ser. Depois de a ler não sei se me atreverei a escrever mais "poemas". Um beijo grande.

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